“ - Por que me chamas tu Ceci?
O índio sorriu tristemente.
- Não sabes dizer Cecília?
Peri pronunciou claramente o nome da moça com todas as silabas; isso era tanto mais admirável quanto a sua língua não conhecia quatro letras, das quais uma era o L.
- Mas então, disse a menina com alguma curiosidade, se tusabes o meu nome, por que não dizes sempre?
- Porque Ceci é o nome que Peri tem dentro da alma.
- Ah! É um nome da tua língua?
- Sim.
- O que quer dizer?
- O que Peri sente.
- Mas em português?
- Senhora não deve saber.
A menina bateu com a ponta do pé no chão e fez um gesto de impaciência.
D. Antônio passou; Cecília correu ao seu encontro.
- Meu pai, dizei-me o que significa Ceci nessa língua selvagem que falais.
- Ceci!... disse o fidalgo procurando lembrar-se. Sim! É um verbo que significa doer, magoar.
A menina sentiu um remorso; reconheceu sua ingratidão; e lembrando-se do que devia ao selvagem e da maneira por que o tratava, achou-se má, egoísta e cruel.
- Que doce palavra! Disse ela a seu pai, parece; um canto de pássaro.
Desde este dia foi boa para Peri; pouco a pouco perdeu o susto; começou a compreender essa alma inculta; viu nele um escravo, depois um amigo fiel e dedica.
- “Chama-me Ceci, dizia às vezes ao índio sorrindo-se; esse doce nome me lembrará que fui má para ti; e me ensinará a ser boa.”
O Guarani – José de Alencar